Em 2021, mais da metade dos jogadores de futebol do país recebia cerca de um salário mínimo
Assim como
muitos trabalhadores, o goleiro precisa de um segundo emprego para conseguir
pagar as contas. Nada parecido à rotina de salários milionários, fama e viagens
internacionais de Neymar e companhia.
Ainda
assim, Dias é, de certa forma, um privilegiado. Grande
parte dos atletas ganha menos do que ele – e também complementam a renda com
outras atividades, em especial as informais, como motoristas de
aplicativo. Há ainda relatos de jogadores que trabalham como mecânicos, por
exemplo.
Média salarial
No mercado
formal, o Ministério do Trabalho e Previdência estima,
atualmente, cerca de 11 mil atletas profissionais com carteira de trabalho
assinada, com média salarial de R$ 8,4 mil.
Mas,
como alguns poucos salários muito elevados puxam a média para cima, a realidade
da grande maioria é de rendimentos bastante achatados: segundo os dados mais
recentes da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), divulgados em 2016, mais de 80% dos atletas assalariados recebiam até R$ 1 mil.
Apenas 0,12% recebiam entre R$ 200.000,01 e R$ 500 mil mensais.
“As
discrepâncias e injustiças existem não só no esporte, mas em toda a sociedade.
Então, se você fizer uma comparação entre o universo do futebol e passar para
qualquer outra área produtiva, você vai ver isso expresso”, afirma o professor
João Paulo Medina, fundador da Universidade do Futebol.
Cargos
e salários
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged)
dão uma noção de como a remuneração dos jogadores está inserida no mercado de
trabalho brasileiro.
Na lista
dos maiores salários médios de contratação com carteira assinada no país em
2021, os atletas profissionais de futebol, com média salarial de R$ 8,4 mil,
não figurariam nem entre as 100 ocupações com a melhor remuneração de
contratação do país.
Na
100ª posição, aparece gerente de comunicação, com salário inicial de
contratação de R$ 9.268,13 – ainda quase R$ 1 mil acima da média de remuneração
paga aos atletas profissionais do futebol.
Ídolo
e educador físico
O goleiro André Dias não é qualquer um dentro do esporte: ídolo
do Juventus, tradicional clube da capital paulista, é o jogador que mais atuou
neste século pelo time, que disputa atualmente a segunda divisão do campeonato
estadual.
Mesmo
assim, nas horas
vagas, trabalha como personal trainer para complementar renda.
É assim que ele, casado e com duas filhas, consegue melhorar o orçamento da
família e continuar no esporte.
A
gente vive o futebol real, né? Na verdade, a segunda prateleira do futebol. O
pessoal pensa muito em grandes salários, calendários cheios, mas não funciona
bem assim”, comenta.
Realidade do mercado
Apesar
da escassez na divulgação de dados, levantamentos ajudam a mensurar as
dificuldades enfrentadas pela grande maioria dos atletas profissionais do país.
Informações
da Universidade do Futebol com base em dados da CBF indicam que mais da metade
(55%) dos jogadores profissionais no Brasil recebiam, em 2021, aproximadamente
um salário mínimo. Naquele ano, o valor do mínimo era de R$ 1,1 mil.
Considerando
um universo estimado em 90 mil jogadores profissionais – incluindo atletas das
categorias de base com contrato profissional –, cerca de 49,5 mil recebiam este
valor, de acordo com o mapeamento da instituição acadêmica. E os números vão
além: do total de atletas, 33%, o que representa quase 30 mil pessoas, recebiam
entre R$ 1.001 mil e R$ 5 mil.
“Não
há ainda, no Brasil, políticas consistentes para que a gente possa ter como
meta superar essa situação ao longo dos próximos 10 ou 20 anos – o que seria
necessário para mudar essas estruturas”, diz Medina. “Muitos não têm
consciência de que é justamente essa base que sustenta a elite do futebol.”
Calendário curto
Além
de receber salários menores, grande parte dos atletas vive com a insegurança de
não ter trabalho durante todo o ano, já que o calendário é muito mais enxuto. E
nos meses em que não há competições, não há emprego – e nem salário.
“Nos
meses sem contrato, a renda da minha família vem da atividade como personal
trainer e do trabalho da minha esposa”, conta André Dias. “O futebol representa
um terço da nossa renda familiar.”
O
coordenador de futebol do Juventus, Marcel Barbosa, explica que, por questões
financeiras, o clube mantém contratos mais longos – de um ou dois anos – apenas
com os atletas promovidos das categorias de base. No caso dos jogadores mais
experientes, os contratos são feitos por competição.
Segundo
ele, a grande dificuldade dos clubes para oferecer salários melhores são os
patrocínios. "Nós estávamos fazendo um planejamento para o ano que vem,
mas acabamos perdendo um patrocinador importante”, diz, ressaltando a
necessidade desses recursos.
Escolaridade
Muitos
jogadores deixam de investir nos estudos para se dedicar ao futebol. Um dos problemas é o impacto disso no futuro, com atletas encerrando
uma carreira curta, pouco rentável e sem uma boa formação para seguir a vida em
outra área, alerta o professor Medina.
“Se
você se desenvolve bem, explora todo o seu potencial intelectual e cultural,
você vai ter um plano de carreira melhor estruturado. Com isso, vai otimizar
seus investimentos na vida, sejam eles quais forem. Quando sua carreira se
encerrar, poderá fazer uma transição e, quem sabe, continuar no futebol, que
hoje engloba mais de 200 profissões”, diz o professor Medina.
Formado
pelas categorias de base do Corinthians, o goleiro André Dias concluiu o curso
de Educação Física ao longo dos 13 anos em que permaneceu no clube, antes de ir
para o Juventus.
“Tive
o privilégio de conseguir conciliar o futebol e os estudos. Foi o meu modo de
sobrevivência dentro do futebol. Muitos atletas acabavam parando ao longo do
processo por causa dessas lacunas. Eles precisavam sustentar suas casas”, diz.
Hoje,
ele orienta os atletas mais jovens. “Eu me preocupo em passar a importância do
desenvolvimento intelectual junto ao esporte, a importância de uma vida
acadêmica. Porque, para mim, foi muito importante não só para o sustento da
minha casa, quando não tive o respaldo do futebol, mas também para a minha vida
social”, conta.
Na
segunda profissão, André Dias já treinou equipes universitárias, foi instrutor
de academia – simultaneamente à vida de atleta profissional – e, hoje, trabalha
como personal trainer.
“Foi
a maneira que encontrei de sobreviver, ter uma renda fixa e dar estabilidade
para a minha família, além de poder seguir no futebol, que é muito complicado”,
continua.
Fonte:
https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2022/12/04/salario-medio-de-jogadores-de-futebol-nao-alcanca-nem-as-100-maiores-remuneracoes-de-contratacao.ghtml.
Acesso em 04/12/2022.
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